Kamilly Gabriele dos Santos reclama do alto custo de alimentação atualmente (Ramon Bitencourt)Com o custo de vida cada vez mais alto no país, um dos maiores desafios dos brasileiros tem sido garantir a comida no prato, até mesmo o básico. Enquanto isso, o agronegócio comemora recordes de faturamento e a expectativa de continuar com os bons resultados nos próximos anos.
A boa perspectiva do setor vai na contramão da desesperança fortalecida pela alta nos alimentos, principalmente para a população mais vulnerável, como é o caso de Kamilly dos Santos, 18, desempregada. Até o ano passado, ela sustentava a casa e a filha, de 2 anos, com os cursos de maquiagem que dava em casa, no bairro Piratininga, na região de Venda Nova, em Belo Horizonte. Mas, com a pandemia, viu sua única fonte de renda desaparecer além das medidas de isolamento, ela não conseguiu achar emprego.
A gente não coloca mais nem mais o arroz com feijão no prato. O óleo está muito caro, carne virou luxo. A gente se vira com fubá e angu. Mandei minha filha para a casa da minha mãe, não estou conseguindo dar nem o alimento a ela, lamenta.
Apenas a cesta básica em BH subiu 15,93% em 12 meses. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas e Contábeis de Minas (Ipead/UFMG), a alta dos custos com alimentação foi puxada, principalmente, por óleo de soja (80,96%), arroz (63,05%) e açúcar cristal (33,33%). O arroz com feijão aumentou 61,7% na comparação com março do ano passado. De acordo com a FGV/Ibre, a alta no prato feito bateu dez vezes a inflação nos últimos 12 meses (6,1%). Enquanto o arroz subiu 60,8%, o feijão encareceu 69,1% no último mês.
O cenário para o agronegócio brasileiro, porém, é outro. Só no último mês, as exportações do setor alcançaram US$ 11,57 bilhões. A cifra é a maior para o mês de março em toda a série histórica desde 1997. O câmbio aumentou muito durante a pandemia, e isso incentivou a exportação, é muito mais vantajoso para o produtor. Mas, quanto mais você exporta, desabastece o mercado interno. Com oferta menor, os preços tendem a subir, explica o economista do FGV Matheus Peçanha.
Com o dólar depreciado, comprar nosso produto ficou mais barato. Além disso, vários países não estão produzindo em virtude das políticas de isolamento. O mercado compra de quem tem disponível, como é o caso do Brasil, ressalta o professor do Ibmec Felipe Leroy.
Segundo Peçanha, até o auxílio emergencial influenciou a alta dos preços. O dinheiro do auxílio vai para o alimento, aumentando a demanda, pressionando o preço do prato feito, diz.
Custo de produção subiu, alega Faemg
A coordenadora da Gerência Técnica da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Aline Veloso, afirma que, além da lei da oferta e da demanda, a elevação nos preços dos insumos teve influência direta na inflação no preço dos alimentos.
Assim como o dólar é um ponto de atenção para as exportações, para as importações o câmbio influencia o custo da produção, como é o caso dos fertilizantes, que ficaram mais caros, explica. Aline descarta, porém, risco de desabastecimento.
Minas está entre os cinco Estados que mais exportaram nos últimos anos. Em 2020, o Produto Interno Bruto (PIB) da agropecuária mineira alcançou seu maior valor nos últimos dez anos: R$ 150,8 bilhões.
Mas o subsecretário da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, João Albanez, diz que o crescimento requer atenção. O custo da produção está aumentando, e há uma preocupação com o abastecimento interno, já que o milho e a soja estão indo não só para a demanda externa, mas para o etanol e o biodiesel, avalia.
O economista Felipe Leroy fala em equalização dos dados. Não tem muito jeito, o governo está com um sério problema fiscal, e qualquer tipo de política para o mercado interno precisaria de dinheiro. Para ele, a solução virá da melhora da pandemia e do câmbio.
Fonte: O Tempo
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